sábado, novembro 26, 2005
Basta olhar o cinzento

Lembro-me das nuvens carregadas de dissabores, do cinzento que nos tapava as cabeças. Testa com testa, seguraste-me a mão como se da última vez se tratasse, e tentaste dar lógica àquilo que logo à partida não tinha, deste-me a entender a delicadeza do momento, e desde logo um mar de incertezas e promessas inconcretizáveis se abateu sobre mim. Sabias que não podia acabar assim. Não naquele momento, não comigo. Não.

“espero que um dia consigas encontrar o que não encontraste aqui.”, disseste tu. Estavas farta de saber que a Vida me obrigava a não esperar nada de nada, mas ali só te consegui dizer “tenho saudades tuas” tenho porque sim, porque já não te sentia ali, sentia-te longe, e não conseguia dizer mais nada. E ali ficamos de pé, deixamos primeiro o silêncio falar, e depois as lágrimas, deixamos que pingassem levemente nas nossas mãos unas, de olhos fechados senti a tua mão escorregar na minha, e resignei-me a deixar-te partir, na esperança efémera de um dia voltares com a mesma disposição.

Agora sem nervosismos, e sem o medo da perda iminente digo-te o que não te consegui dizer nem por palavras, nem por gestos. Que me assusta esperar demais. Assusta-me poder perder-te, se é que alguma vez te tive, pela dureza da distância, pelo passar vincado dos meses, dias, horas, minutos, que nos afastam impiedosamente. E peço-te que olhes às estrelas, porque elas sabem de mim, elas, melhor que ninguém, sabem dizer-te o que sinto por ti, e sabem dizê-lo com palavras quentes e doces. E todas as noites lhes falo de ti, e elas já te traçam as feições de olhos fechados.

Conseguia pintar agora a tua cara, porque sim, porque me basta olhar o cinzento.



Esta música é lindíssima e escrevi parte deste texto a ouvi-la. Parece que consegui mesmo arranjar tempo para aqui, felizmente.

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pelo Miguel às 12:19 da manhã | aqui |


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