Lembro-me de quando tinha 10 anos, era Verão, estava em Sesimbra. Todos os dias lanchava sobre o mesmo tabuleiro, tinha vários desenhos, cada um fazia-se acompanhar por um número, número esse que para mim era o passar dos anos, a minha idade. Havia um que era o super-homem e eu já tinha passado pela idade correspondente, e agora o desenho mais almejado eram 2 trapezistas num 10, nesse Verão fiquei contentíssimo por ter chegado aos 10 anos, algarismo com 2 dígitos, com 2 trapezistas, o último número dessa sequência representada no tabuleiro.
Há dois dias, fiz 20 anos. E sinto que não mudei rigorosamente nada: ainda acredito no amor, e continuei a acreditar firmemente, que no escuro se esconde qualquer coisa paranormal.
Sai à rua assim que me chegou aos ouvidos que já não moravas mais naquela casa de apetrechos imensos. Todos os dias te espero na esquina onde os amores são vagabundos de quem os menosprezou, espero sem relógio, sem esperança na brutalidade desprezível de um encontro acidental. Hoje tenho sentimento na ponta da língua, e milhentas palavras com que te posso brindar desde já.
Hoje sinto-me livre, como num carro a 200 Km/h de vidros abertos, com o vento a confirmar-nos o repto à liberdade inconsciente.